Spotlight: Segredos Revelados (2015)
Título original: Spotlight
Origem: EUA / Canada
Direção: Tom McCarthy
Roteiro: Josh Singer, Tom McCarthy
Com: Mark Ruffalo, Michael Keaton, Rachel McAdams, Josh Slattery, Brian d’Arcy James, Stanley Tucci, Liev Schreiber
Vamos hoje para o quinto da série “rumo ao Oscar”, concorrendo em seis categorias (Melhor Filme, Melhor Direção, Melhor Roteiro Original, Melhor Montagem, Melhor Ator Coadjuvante para Mark Ruffalo, Melhor Atriz Coadjuvante para Rachel McAdams) e, pelo que ando lendo e ouvindo por aí, um dos mais fortes candidatos na opinião do público e da crítica: Spotlight – Segredos Revelados.
Assim como O Regresso, A Grande Aposta, Carol e Joy (os dois últimos não concorrem a melhor filme), Spotlight também é baseado em fatos reais. Fatos, aliás, bem cabeludos que envolvem os maiores poderes do nosso mundo: a Igreja, a Justiça e a Imprensa!
Uma história (investigação) pra lá de interessante – ganhadora de um Prêmio Pulitzer – com potencial para gerar uma obra-prima do cinema. Só que não!
Sem querer mais uma vez ser uma estraga-prazeres, tenho que admitir que não achei assim uma Brastemp! O filme é bom, tem muitos méritos que vão além da sétima arte, mas não é fantástico! Demora muito para decolar – os primeiros quinze ou vinte minutos não prendem – e por essa razão, perde um pouco a “liga”. A segunda parte, tem melhor ritmo e acaba conseguindo envolver-nos mais na investigação, sem, porém, chegar a nos tocar como fez Philomena, de Stephen Frears (2013), que também contava horrores envolvendo a Igreja (Leia o post do dia 2/2/14). Como se, de certa forma, o diretor McCarthy também quisesse se proteger um pouco…
Ao filme:
Spotlight conta a história da investigação de diversos casos de pedofilia envolvendo membros da Igreja Católica em Boston – chegando até ao Arcebispo da cidade, Cardial Law (Len Cariou) – descobertos pela equipe do jornal The Boston Globe conhecida pelo pseudônimo de Spotlight. Michael Rezendes (Mark Ruffalo), Sacha Pfeiffer (Rachel McAdams) e Matty Carrol (Brian d’Arcy James), chefiados por Walter Robinson (Michael Keaton) formam o time de elite do jornal, responsáveis por investigações confidenciais que podem durar meses ou até anos. Assuntos graves que não podem ser divulgados no calor da hora nem da emoção.
Seguindo o estilo clássico de se fazer cinema, sem ir buscar apoio na tecnologia de ponta nem em efeitos “pirotécnicos” diversos, o filme é narrado de forma linear, com algumas elipses, mas sem recorrer muito aos tradicionais flashbacks, recurso que poderia ter sido usado e abusado pelo diretor para causar um efeito de comoção no público. A escolha de McCarthy, no entanto, recaiu sobre o formato jornalístico limpo, direto, honesto, sem melindres, um dos pontos fortes do filme, apesar de talvez ser justamente este o fator responsável pela falta de conexão total com espectadores. Um certo distanciamento jornalístico que tem seu mérito, mas que, ao mesmo tempo, pode ser lido como um certo receio de exibir algo que se configura em mais uma “bomba” para a poderosa Igreja Católica.
O excelente trabalho da equipe Spotlight na vida real (e também da equipe de atores que os interpretou) resultou em um igualmente excelente trabalho de denúncia, via sétima arte, dos horrores que continuam a existir na Igreja Católica. Crimes contra crianças e adolescentes que seguem marcados por toda vida. Com certeza, um filme que vai incomodar muita gente e que vai fazer grande parte do público pensar e refletir sobre até onde vão os limites do poder “divino” que a Igreja tanto reclama para si. Um poder sem fronteiras, que não obedece às leis dos humanos e que se julga por isso superior. Um poder que intimida, que amedronta, que ameaça, já que protegido pelo que não se explica, pelo que não se racionaliza, nem se questiona: a fé. Isso sem falar na “parceria” da Justiça e da própria imprensa que, por também temer o poder “superior” da Igreja, deixa passar tantos casos criminosos comprovados.
Muito interessante observar que o processo todo de desmantelamento da rede de pedofilia da Igreja Católica tenha sido iniciado com a chegada do novo editor-chefe, “estrangeiro” a Boston, e também “estrangeiro” ao catolicismo. Marty Baron (Liev Schreiber) é um judeu que acabara de assumir a chefia do jornal depois de já ter passado por Miami e Nova Iorque. Um novo olhar, ainda não acometido pela miopia da região, que consegue enxergar bem mais longe.
Apesar de ter começado esta análise falando que Spotlight não é assim uma Brastemp, gostaria de retomar o raciocínio. Quando digo isto, refiro-me a quesitos técnicos, estéticos, à cinematografia em seu estado puro. No entanto, filmes como estes são importantíssimos e fundamentais em todos os tempos. O cinema pode e deve ser usado para denunciar, para apontar, para nos acordar, para sacudir nossos pontos de vistas acomodados, míopes e doutrinados. Talvez o prêmio adequado para Spotlight não seja mesmo um Oscar… ele merece muito mais! Merece nosso aplauso pela coragem, pela ousadia e por permitir o seguimento de uma investigação que não pode parar. Merece prêmio por levar a um número muito maior de pessoas uma denúncia de práticas indecentes que até hoje existem e persistem na Igreja Católica. Que me perdoe minha mãe, que tanto preza pela Igreja, pela religião e que tanto reza para aumentar sua fé… Mas Deus não é a Igreja. Ela é só uma instituição feita por homens, por gente de carne e osso. Gente que erra – e erra muito – por se acreditar dotada de um poder divino, maior que o dos outros seres humanos. E a fé, ao mesmo tempo que traz paz, também cega, amedronta e até corrompe! Que filmes como Spotlight sirvam para deixar nossos olhos bem abertos!
PRA PENSAR.