Carol (2015)

Título original: Carol

Origem: EUA / Inglaterra

Direção: Todd Haynes

Roteiro: Phyllis Nagy, Patricia Highsmith (livro)

Com: Cate Blanchett, Rooney Mara, Sarah Paulson, Kyle Chandler, John Magaro, Jake Lacy

 

Terceiro da série “rumo ao Oscar”, hoje vou falar de um filme talvez um pouco menos pretensioso do que os dois anteriores, mas, nem por isso, de menor qualidade.

Carol é um filme de fácil compreensão, sem rodeios, nem subterfúgios, em que nada está implícito, apesar de seu tema ainda tabu em tantas sociedades: a homossexualidade feminina. Imaginem, então, nos anos 50, época em que a história se desenrola.

carol poster

Em 1952, aliás, a Associação Americana de Psiquiatria acabava de incluir a homossexualidade na lista de distúrbios mentais (sociopathic personality disturbance). Neste mesmo ano, a jovem escritora Patricia Hightsmith, que havia tido enorme sucesso com seu primeiro livro Strangers on a Train, graças à adaptação feita por Hitchcock às telona – em português Pacto Sinistro (1951) –, viu-se obrigada a publicar seu segundo romance sob o pseudônimo Claire Morgan. O motivo? O conteúdo “escandaloso” de sua história: amor entre duas mulheres.

E é justamente baseado na obra The Price of Salt, considerada pornográfica para a época, que Carol foi realizado.

Em uma Nova Iorque dos anos 50, o filme conta a história de amor entre Carol (uma Cate Blanchett mais elegante do que nunca!) e Therese (Rooney Mara). Mulheres de gerações diferentes, classes sociais também diferentes, vivendo momentos igualmente distintos em suas vidas. Carol, mulher rica e belíssima, está em pleno processo de divórcio, ainda discutindo com o ex-marido a guarda de sua única filha. Therese, jovem da típica working class americana, trabalha em uma loja de departamentos chique, vendendo bonecas para clientes endinheiradas, mas sonha em tornar-se fotógrafa profissional algum dia. Tem um namorado – Richard (Jake Lacy) – que planeja casar-se com ela e ainda leva-la para uma viagem de sonhos na Europa.

Por uma obra do destino (e quem sabe do bom velhinho, já que a história se passa no período do Natal), as duas mulheres acabam se encontrando, se conhecendo e, pouco a pouco, percebendo-se atraídas uma pela outra.

Iniciado com um belo plano-sequência que nos dirige, por meio de um gracioso movimento de câmera, a um chique restaurante em Manhattan, somos então apresentados às duas protagonistas. De uma conversa interrompida nesta primeira cena, passamos então a um longo flashback, em que veremos o desenrolar da relação que une as duas mulheres. Um romance que tem como pano de fundo uma sociedade extremamente moralista e todas as implicações e complicações que representam viver uma relação homossexual naquela época, ainda mais sendo mãe, em processo de divórcio e lutando pela guarda da filha.

Indicado à Palma de Ouro em Cannes em 2015, mas não levando a estatueta, impossível não traçar aqui um paralelo com o badalado filme francês La Vie d’Adèle (2013), de Abdellatif Kechiche (se você não viu, leia o post do dia 20/10/13), que também retrata o romance entre duas mulheres de classes sociais diferentes e que, no caso, ganhou a Palma de Ouro em 2013. Enquanto o diretor do filme francês insistiu em mostrar todas as partes, optando por uma estética crua, realística e nua do romance (sobretudo nas cenas de sexo), Todd Haynes optou pela sutileza, pela sensualidade e pela elegância. Enquanto o filme de Kechiche nos choca, o de Haynes nos encanta. É belíssimo! Cheio de cenas-fetiche, com vários closes de mãos, nucas, cabelos, bocas e olhares, mas tudo de uma suavidade, delicadeza e beleza inacreditáveis, mostrando que não é preciso agredir o espectador para tocá-lo. Do lado de cá da tela, torcemos pelo amor das duas personagens, envolvemo-nos com seus sofrimentos e angústias e alegramo-nos com suas pequenas felicidades.

Filmado com uma Super 16mm (o mais comum é usar uma 35mm) o filme ganhou uma tonalidade meio envelhecida, meio amarelada, meio “antique”, sofisticada. Janelas e vidros são temas recorrentes em Carol. Olhares que veem e são vistos através de vidros opacos, embaçados, molhados, sujos. Seres humanos que se escondem, se protegem e, ao mesmo tempo se enxergam nesse jogo transparência-opacidade tão bem empregado aqui por Haynes.

A trilha sonora – composta por blues, jazz e pop americana dos anos 50 – também merece destaque. Ela acompanha à perfeição o ritmo e o tom elegante do filme, indo de Billie Holiday a The Clovers, passando por Georgia Gibbs e Les Paul and Mary Ford. Muito boa!

Para terminar, enquanto A Grande Aposta e O Regresso são filmes extremamente masculinos, este aqui é pura feminilidade. Com ritmo perfeito, duração também (não se vê a hora passar), Carol é um filme delicado, lindo, sensual, feminino, elegante, conciso, redondo! Mas talvez não original o suficiente para ganhar um Oscar. Já Cate Blanchett e Rooney Mara podem, sim, sair no dia 28 carregando uma estatueta dourada. A primeira por Melhor Atriz e a segunda por Melhor Atriz Coadjuvante. Vamos aguardar!

PRA SE ENCANTAR.

 

~ by Lilia Lustosa on fevereiro 13, 2016.

2 Responses to “Carol (2015)”

  1. Concordo, concordo e concordo. Seja lá que forma de afeto esteja na tela, para mim, o que vale é a delicadeza, a sutileza, o sugerido, o que se vai construindo até o momento em desejamos ver e fazer parte da intimidade dos personagens. Talvez seja essa construção simultânea do amor entre as personagens e do meu “amor” pela história delas que me tenham encantado. Adorei!

    • Isso aí, Ana. Para mim Carol foi encantamento do começo ao fim. Uma história muito bem construída, delicada, sensível, elegante, sem exageros, sem excessos, sem se deixar cair tampouco no “conto de fadas” nem no melodrama barato… Uma linda história de amor! E pra completar, com a “tudo de bom” Cate Blanchett. Como não se encantar?

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