Django Livre (2012)
Título original: Django Unchained
Diretor: Quentin Tarantino
Roteiro: Quentin Tarantino
Com: Jamie Foxx, Christoph Waltz, Leonardo DiCaprio, Samuel L. Jackson
Irônico, inteligente, burlesco, pop, ousado, insano, o último filme do grande Tarantino é uma divertida homenagem ao gênero western, ao mesmo tempo em que propõe uma séria reflexão sobre o terror da escravidão!
Três anos depois de ter triunfado com Bastardos Inglórios (2009) – que coloca o dedo na ferida alemã, contando, à sua maneira, a perseguição aos judeus na Segunda Guerra – Tarantino volta às telas com mais um filme sobre um dos grandes horrores da História da humanidade: a escravidão dos negros nos Estados Unidos da América.
Para tratar do tema (já mil vezes explorado), ele joga, no entanto, com sua liberdade artística (uma de suas marcas) e o mistura com outro horror da história norte-americana: o massacre dos índios na conquista do oeste. Nasce aí um western original, carregado de influências europeias (sobretudo o spaghetti italiano), em que a briga acontece entre brancos e negros, ao invés de brancos e índios, e o cowboy é um negro recém-alforriado, e não um John Wayne, branco e livre.
Mas a liberdade artística – ou brincadeira – de Tarantino não para por aí!
Christoph Waltz – ator austríaco que deu show como o alemão nazista endemoniado – está presente também neste filme, mais uma vez arrebentando em sua atuação, agora na pele de Dr. King Shultz. Um mercenário, caçador de recompensas, disfarçado de dentista, que oferece ao escravo Django (Jamie Foxx) sua liberdade em troca de seus conhecimentos sobre alguns dos bandidos da região. O curioso é que, desta feita, ele não é o mauzão da história – embora mate por dinheiro (?!) – mas sim, aquele que, com seu olhar estrangeiro, é capaz de enxergar e de apontar as barbaridades da situação ali estabelecida.
Os dois vão iniciar, então, uma boa parceria e uma bela amizade regada a diálogos interessantes, divertidos e inteligentes, no melhor estilo Tarantino.
Igualmente interessante é perceber que Tarantino vai buscar em uma lenda alemã o “fil rouge” de sua história, em que o herói Siegfried corre em socorro de sua amada Brunhilde, presa em uma montanha rodeada de fogo e de dragões, como conta Dr. Schultz a Django numa bela cena noturna. No caso aqui, Django seria Siegfried, cujo único objetivo é libertar sua amada esposa, a bela Broomhilda von Shaft (Kerry Washington), escrava da Casa Grande, que foi ensinada por sua antiga dona a falar alemão, e que vive hoje presa em Candieland, nas mãos do perverso dragão Monsieur Candie (fantástico Leonardo DiCaprio), grande proprietário de plantations.
Para contar esta história de roteiro aparentemente simples (herói que quer salvar sua amada das mãos de bandidos), Tarantino vai se valer de seu repertório de cinéfilo e de cineasta, indo buscar referências em vários grandes diretores do western mundial, tais como Sergio Leone, William Witney ou ainda John Ford… Embora ele próprio tenha declarado não apreciar o trabalho de um homem que atuou como membro da Ku Klux Kan em O Nascimento de Uma Nação (1915) – filme extremamente racista, de Griffith – e que passou sua vida, segundo ele, fazendo filmes que ressaltavam a superioridade do homem branco sobre os índios. (Uma pena que Tarantino confuda o homem com o artista!) Mas que o plano de Django e Dr. Shultz de costas, montados nos cavalos, ao pôr do sol, em que só vemos suas silhuetas, ou, ainda, a cena do cemitério, também ao cair da noite, são de uma estética bem fordianna. Ah, isso são! Talvez um ato falho que Freud possa explicar…
Na verdade, desde a abertura – bem ao estilo dos westerns dos anos 60 – até a trilha sonora do filme – uma miscelânea pop, com músicas que vão desde o country, passando pelo soul, hip hop até o rap contemporâneo escrito pelo ator principal Jamie Foxx – percebe-se que Tarantino aproveitou-se dessa sua última cria para se soltar e se divertir um bocado, usando e abusando da sátira para passar seus recados.
A sequência dos homens brancos encapuzados que, antes de partirem para destruir Django, param para discutir sobre a utilidade de seus capuzes é um exemplo disto. Absolutamente hilária, ela tem tudo para se tornar uma pérola do cinema!
E, se pensarmos bem, talvez seja justamente essa grande liberdade, essa ausência de medo de ser bobo ou infantil, esse prazer da brincadeira e essa maneira simples de passar sua mensagem que façam de Tarantino o gênio que ele é. E de seus filmes, filmes tão bons de assistir. Mesmo que durem 2h45min…
Django Livre é um filme divertido sobre um assunto sério! PRA SE DISTRAIR e PRA PENSAR.